5 de junho de 2007

40 anos após conquistas, Israel vive dilema

(Original aqui)

Análise é de Rosemary Hollis, especialista em Oriente Médio.
Ela comenta as 4 décadas da Guerra dos Seis Dias.

Há exatos 40 anos Israel obteve uma histórica vitória militar no Oriente Médio e redesenhou o mapa múndi. Com muitas bombas e pesada artilharia, conquistou territórios de países vizinhos e trocou de papel: deixou de ser a vítima dos árabes e assumiu o protagonismo geopolítico na região. Mas passadas quatro décadas Israel enfrenta agora um dilema: como conciliar os três objetivos da criação do país (manter-se um Estado judeu, democrático e na terra bíblica).

A análise é de Rosemary Hollis, diretora do programa de estudos do Oriente Médio do Instituto Real de Relações Internacionais da Inglaterra. "De um pequeno país ameaçado e vulnerável, a guerra fez emergir uma nova potência regional, capaz de conquistar o reconhecimento das nações que o ameaçavam. Israel passou a ser visto como o conquistador. E agora tem que saber lidar com esse protagonismo e com seus interesses, nem sempre convergentes”, afirmou ela em entrevista ao G1, por telefone.

Para Hollis, é impossível satisfazer os três objetivos simultaneamente. Se quiser ter um Estado no território desejado, deve capturar uma população árabe (que era de 1 milhão em 1967 e chega perto dos 4 milhões atualmente), e daí a predominância judaica deixa de existir, a não ser que se imponha uma espécie de apartheid. Se quiser ter a predominância judaica e a democracia, precisa abrir mão do território. O dilema atualmente é como equilibrar os três objetivos", explica a pesquisadora inglesa.

Leia abaixo os principais trechos da entrevista.

G1 - É possível considerar a vitória israelense na Guerra dos Seis Dias completa?
Rosemary Hollis - Israel saiu da guerra vitorioso, em termos militares, mas levou consigo dois problemas imensos. Em primeiro lugar, sua imagem foi transformada por sua vitória total. Ele deixou de ser um pequeno David que se confrontava com o Golias árabe e se tornou o grande personagem da disputa, o opressor dos palestinos. Hoje Israel não é mais visto como a vítima das agressões na região, que tem sua existência ameaçada, como acontecia naquela época. Hoje ele é o principal personagem dessa história do Oriente Médio, e tem que fazer concessões para chegar à paz.

O segundo ponto é que Israel ficou num dilema de segurança, depois de 1967. Eles [os israelenses] podiam voltar a ser de um pequeno país, mais vulnerável, ou podiam capitalizar a vitória da Guerra dos Seis Dias, mantendo um território maior e mais seguro, devolvendo apenas parte das terras conquistadas. A questão é que nesse processo, junto com as terras, eles capturaram uma fração da população palestina, que passou a ser dominada por Israel e a resistir a esta dominação, criando uma nova forma de insegurança.

Este dilema atinge em cheio os três objetivos dos sionistas ao criarem Israel, que eram ter um Estado judeu, democrático e na terra bíblica. Mas é impossível ter os três. Pois, se quiser ter um Estado no território desejado, deve capturar uma população árabe (que era de 1 milhão em 1967 e chega perto dos 4 milhões atualmente), e a predominância judaica deixa de existir, a não ser que se imponha uma espécie de apartheid. Se quiser ter a predominância judaica e a democracia, precisa abrir mão do território. O dilema atualmente é como equilibrar os três objetivos.

G1 - Como a Guerra dos Seis Dias se reflete na atual situação de conflitos no Oriente Médio?
Hollis - Há duas questões importantes. A primeira é que há um conflito histórico sobre a localização do Estado de Israel na região, fato interligado à questão dos refugiados palestinos, que vem desde a criação de Israel e a guerra de 1948. É um conflito bem anterior à Guerra dos Seis dias, e que se mantém até hoje.

A segunda questão é que depois da guerra de 1967 as possibilidades para a resolução do conflito se distanciaram da discussão sobre a própria existência de Israel. Israel conseguiu isso em seu tratado de paz com o Egito em 1978, quando devolveu os territórios daquele país em troca de paz. Uma paz que dura até hoje entre os dois países. Há uma questão controversa na relação entre Israel e os países árabes, que exigem que o seu território conquistado por Israel também seja devolvido.

G1 - Como a guerra afetou a relação de Israel com o resto do mundo e do mundo com os conflitos no Oriente Médio?
Hollis - Israel tinha muito apoio internacional até o início da Guerra dos Seis Dias. A vitória arrasadora que teve no conflito mudou sua posição, deixando de ser visto como vulnerável e passando a ser visto como o conquistador. Podemos fazer um paralelo com o que acontece com os Estados Unidos atualmente no Iraque. Não se pode dominar uma população ocupada contra sua vontade. Os israelenses tiveram a esmagadora vitória militar, mas se tornaram vulneráveis internacionalmente por estarem ocupando territórios palestinos contra a vontade desses povos.

A opinião internacional, então, varia. Os norte-americanos se identificam com os israelenses e os acham defensores da democracia numa região hostil, enquanto na Europa vem crescendo a percepção de que os israelenses não podem querer estar seguros enquanto ocuparem o território palestino contra a vontade do povo palestino.

G1 - É possível imaginar como estaria o Oriente Médio hoje em dia se não tivesse ocorrido a guerra em 1967? Haveria o risco de o Estado de Israel realmente deixar de existir?
Hollis - Não está totalmente clara a resposta. Os árabes não estavam preparados para fazer acordos de paz antes da guerra, e estavam ameaçando Israel, por mais que não tivessem todos os meios militares necessários para levar a cabo essas ameaças. Acontece que Israel estava sendo ameaçado, e não tinha como saber da falta de capacidade militar dos que o ameaçavam.

G1 - Israel justificou a Guerra dos Seis Dias com as ameaças sofridas pelo Egito e pelos árabes, que queriam acabar com o Estado judaico. Podemos comparar a situação de então com as atuais ameaças do Irã de “apagar” Israel do mapa?
Hollis - Sim e não. Claro que os israelenses eram ameaçados naquela época. Antes da guerra de 1967 eles não podiam esperar ter paz com os árabes, que queriam eliminá-los. Depois da vitória na guerra, eles tinham algo para barganhar em troca da paz com os países árabes. Atualmente, os iranianos não reconhecem Israel e ameaçam o Estado, mas os israelenses não têm a opção de capturar territórios iranianos para negociar a paz e o reconhecimento. Tudo o que eles podem fazer é ameaçar os iranianos. Há 40 anos, Israel tinha uma opção para garantir a paz. Hoje, não tem. Se Israel atacasse o Irã, não seria possível saber se ele conseguiria a vitória necessária para negociar uma paz.


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