7 de julho de 2007

Li, achei interessante e vou postar

(Original aqui)

Feira do Paraguai: liberou (quase) geral.

Governo reconhece que não controla fronteira. Sacoleiros ganham status. Política industrial se perde em medida provisória. E o Brasil continua o mesmo.

Se você mora no Brasil, deve saber onde fica, em sua cidade, a "feira do Paraguai". Pode ser uma feira de verdade ou um alguém, que atende em casa (ou no seu trabalho) e tem acesso a tudo o que existe do outro lado da Ponte da Amizade. Principalmente produtos digitais, pequenos, de maior valor agregado e maior lucro para os sacoleiros. E a preços que fazem sentido para os consumidores.

Ocorre que a "atividade" de sacoleiro é ilegal. Trata-se de contrabando puro e simples. Ou tratava-se. Em 29 de junho, reconhecendo a impossibilidade de conter a bagunça na fronteira paraguaia, que é de fato uma região de livre comércio, a medida provisória 380 criou um regime especial de tributação (25%) para os produtos vindos do país vizinho e estabeleceu uma cota anual de importação (R$240 mil) por sacoleiro. Diminui o caos, bota mais gente na legalidade, cobra imposto. Teoricamente, o país fica mais simples.

Resta ver se a 380 será suficiente para "organizar" a fronteira. Num iPod de 4GB, Paraguai (menos de R$ 500) e Brasil (mais de R$ 1.000) distam mais de 100%, sem procurar muito. Se os sacoleiros trouxerem só iPod e iPhone (já desbloqueado...), podem dominar o mercado nacional. O que seria, de novo, muito bom para os consumidores. Ainda mais agora, depois de legalizado o “negócio”.

O que força a pergunta: porque o Brasil insiste em cobrar impostos de importação estratosféricos sobre produtos que não produz e que não tem a menor chance de produzir? Será que alguém imagina que o mercado nacional é suficiente para a Apple produzir iPods e iPhones, aqui, só para consumo local? O Brasil não é competitivo, hoje, como plataforma de produção para o mercado mundial. Se fosse, os artefatos digitais que inundam o planeta estariam sendo produzidos aqui e não na China. Ocorre que o Brasil às vezes esquece que o mundo -- e suas estruturas de produção -- é realmente global.

Ainda por cima -- claro -- não é a Apple que “faz” o iPod: o conceito, o design, a cadeia de valor... são “da” Apple, assim como a maior parte do negócio e do lucro. Mas o iPod é feito por aí... no mundo.

Manter o país fechado -- com reservas de mercado vazadas pelo contrabando -- acaba nos tornando ainda menos competitivos. Não há nenhum fabricante nacional que agregue valor à vasta cadeia mundial de acessórios para o iPod. Ou qualquer coisa do tipo. Isso porque a coisa sempre foi imoralmente cara por aqui.

Lançar produtos (digitais, inclusive) no mercado mundial, sem base local, é muito mais difícil e caro… Tivéssemos uma MP380 genérica, para tudo o que vem de fora, de qualquer forma, estaríamos participando de muito mais sistemas de negócio no mundo todo. E teríamos um mercado local muito mais competitivo. E o que rolasse aqui, (principalmente) pensado e (talvez) feito aqui, ia ser pro mundo mesmo.

Está mais do que na hora de entender que não podemos competir, no mundo atual, na base de substituição de exportações e verticalização de cadeias de valor. O mundo é plano e em rede. Um negócio -- qualquer negócio -- pode ficar em qualquer lugar. Qualquer lugar onde o mercado esteja ou a partir de onde seja competitivo produzir para o mundo todo. O Brasil, hoje, para a economia digital (e do conhecimento) não se encaixa direito em nenhum dos dois critérios.

Mas e se a gente enveredasse por educação de qualidade, de longo prazo, combinada com criação de oportunidades e empreendedorismo de classe mundial? Para participarmos da primeira classe da economia do conhecimento? Aí, pouco importa onde se fabrica e quem o faz. Importa (e exporta!) sim, a descoberta, inovação, marcas e marketing, (re)criação das cadeias de valor, redesenho de modelos de investimento e negócio, enfim, tudo o que parecemos estar ignorando enquanto "legalizamos" a fronteira com o Paraguai.

É uma pena. Há tanto que poderia estar sendo feito e, aqui e agora, há tão pouca imaginação e ainda menos ação e coordenação. A MP380 é uma pequena gota de solução num grande incêndio de problemas. O resultado? iPods, iPhones, laptops e muito mais continuarão atravessando fronteiras, e não só a do Paraguai, nas mãos dos “importabandistas de confiança” de sempre. O Brasil é isso aí.


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