1 de agosto de 2007

CInema e filosofia

Nestes últimos dias transformei-me em um cinéfilo. Devido às minhas férias forçadas, venho assistindo a um ou dois filmes por dia (e contribuindo para a degeneração da minha capacidade visual, mas esta é outra história). O objetivo é duplo: primeiro, ver se descubro um novo filme para inserir em minhas disciplinas, e segundo, passar o tempo com momentos agradáveis.

Hoje vi dois filmes: primeiro assisti ao filme "A senha", filme de 2001 e do qual tirei o diálogo postado anteriormente. E agora à noite assisti ao filme "2001: Uma odisséia no espaço" -- já que havia assistido a este filme há mais de 15 anos atrás, não me lembrava de quase nada, a não ser de alguns flashes, e este filme foi um dos que comprei na semana passada.

Tirar uma conclusão deste filme é quase impossível. Após assistir ao filme, quis postar alguma coisa aqui no blog sobre o mesmo e senti uma imensa dificuldade em escrever -- e olha que, pra mim, dificuldade em escrever é algo raríssimo. Resolvi fazer uma busca na internet sobre o filme e aí entendi minha dificuldade: tem de tudo sendo falado sobre o filme.

A análise mais interessante que encontrei sobre o filme está aqui. Este site meio que dissecou o filme e fez um relacionamento extremamente interessante com a filosofia -- e eu concordo com praticamente tudo que tá lá. Como a análise é longa, coloquei apenas o link, e os interessados que corram atrás.

Abaixo, coloquei outra análise, mas não filosófica, e sim "cinéfila" sobre o filme. Menor, mas nem por isso não interessante. O original está aqui.

Por fim, antes de terminar esta postagem, sugiro a todos que assistam ao filme. Provavelmente aqueles que têm pouco cérebro achá-lo-ão chato e enfadonho, devido à "lentidão" do mesmo -- para vocês terem uma idéia, não há um diálogo sequer nos primeiros 25 minutos do filme (e, lendo na internet, vi que o total de diálogos do filme é de apenas 40 minutos, considerando-se que o filme tem 150 minutos). Mas, como também li na internet, este é um filme que não deve ser visto apenas uma vez: a dica dizia algo como "assista ao filme uma vez e deixe passar uma ou duas semanas para a poeira baixar. Depois disso, assista-o novamente, e se necessário repita o procedimento. Só assim você irá entendê-lo". E é o que farei: daqui duas semanas já sei a qual filme estarei assistindo.

2001: Uma Odisséia no Espaço

Não estranhe se, assim que terminar de assistir a 2001: Uma Odisséia no Espaço, a sensação que ficar dentro de você seja de perplexidade, estranheza, incerteza. Isso é normal, afinal, estamos falando de uma (se não for a) das obras mais complexas da história do cinema.

Desde que inauguramos o site tenho vontade de falar sobre este filme, mas nunca me senti arduamente preparado para tal missão. Por quê? É simples. Kubrick, por si só, já é uma figura enigmática e que emprega sub-textos em seus filmes de maneira brilhante, quase sempre de uma maneira pouco perceptível, ou que abra um leque de discussões sobre suas obras, afinal, ele nunca mastiga o que quer para nós. Essa característica do diretor atinge seu auge aqui, neste filme, quando até hoje, passados quase quarenta anos de seu lançamento, continua sendo uma obra de ficção científica atual e discutida, pois nenhuma das interpretações que rolaram até hoje, por mais plausíveis que possam parecer, podem ser consideradas certas.

Como isso? Qual a graça de ver um filme onde não há, aparentemente, um sentido? 2001 é muito mais que isso. O sentido não está no entendimento da história, e sim na reflexão que seus temas, principalmente o homem, proporcionam ao público. É interessante pensar, entender as situações e tentar nos colocar dentro da complexa cápsula do tempo em que 2001 se situa. Sua atualidade, sua ficção e seu deslumbramento se encontram na história, e não em efeitos e ferozes cenas de ação, como a grande maioria dos filmes procuram focar seu interesse. 2001 é feito para neurônios, não para os testículos – e não pense que esta é uma frase preconceituosa, pois 2001 é isso mesmo, um desafio a sua mente. É um filme de questionamentos, não de respostas.

Mas o filme é completo, pensado, perfeito, e até essa lentidão soa como proposital aos olhos dos mais filosóficos, afinal, no espaço, os movimentos parecem ser em câmera lenta. A complexidade técnica causa inveja e estudo até os dias de hoje, mesmo sem existir computadores na época para efeitos especiais (não se esqueçam disso, o que Kubrick fez foi na marra, na técnica, no talento, e até hoje o espaço de 68 continua lindo e convincente). Como não se fascinar, por exemplo, pela bela rotação que a moça dá em certo ponto do filme, saindo de cabeça para baixo pela porta lateral? E a caneta flutuante? E a sala gigante de exercícios, construída para ser rotacional e, em certo momento, Kubrick passeia com sua câmera por ela como se ela fosse plana e estática? E o que dizer do maior corte temporal da história do cinema, quando partimos da pré-história para o século XXI?

A sobreposição de películas para criar um espaço convincente combina perfeitamente com a fina trilha sonora que só mesmo Kubrick consegue combinar em seus filmes – músicas clássicas, antigas, mas que parecem que foram feitas especialmente para as cenas em que são utilizadas, na mais perfeita sinfonia de uma valsa espacial. O número de seqüências clássicas ultrapassa o limite do citável, em uma história definida por três atos: o nascimento, que é toda aquela parte dos macacos pulando, descobrindo seus meios de vida e dando os primeiros passos evolutivos (como ferramentas, deixar de ser caça para se tornar caçador e etc); a luta do homem contra a máquina (quando o super computador HAL 9000 enlouquece com a idéia de ser desligado e passa a aterrorizar sua tripulação) e o próximo passo da evolução humana, em uma psicodélica e diferente seqüência, provavelmente diferente de tudo o que você viu da época - e essas três histórias estão interligadas por um ponto chave, que é a chegada de um monolito à Terra.

Como não poderia deixar de ser, 2001: Uma Odisséia no Espaço é um filme tipicamente Kubrickiano não apenas na história, mas também na forma. Diversos pequenos detalhes enriquecem a obra, como a referência escondida à IBM, que iria patrocinar o filme, mas tirou a cota e deixou Kubrick bastante irritado. Como vingança, colocou as iniciais no computador que se torna assassino como HAL, que são, exatamente, as letras anteriores da sigla IBM. Os espaços são grandes e brilhosos, com poucos ou estranhos objetos de cena, assim como em diversas de suas obras. Dizem que a história é baseada em um livro de Arthur C. Clarke, mas essa informação é discutível, afinal, enquanto o homem escrevia seu livro, Kubrick trabalhava simultaneamente no roteiro, com ambos trocando idéias sobre o desenvolvimento e acontecimentos de uma história em comum.

A importância de 2001 é cristalina: antes dele, os filmes de ficção científica eram aqueles conglomerados de monstros destruindo cidades, sempre vistos com ar trash – características que, após os mais de 100 milhões de dólares arrecadados em bilheterias e sua importância artística, foram alteradas com o tempo. Hoje, por exemplo, filmes de ficção como Solaris podem ser vistos sobre outros olhos. Ganhou, merecidamente, o Oscar de Efeitos Especiais e foi indicado ainda em outras três categorias: Melhor Diretor, Direção de Arte e Roteiro Original (novamente levantando o fato que esta não é uma adaptação). Uma pena que Kubrick tenha perdido a direção para Carol Reed e seu Oliver!, um filme que hoje é muito menos lembrado.

Kubrick era perfeccionista, arrogante, de poucos amigos, mas também um gênio inesquecível do cinema, e 2001: Uma Odisséia no Espaço é sua melhor obra de sua pequena e brilhante filmografia. Apenas ele poderia fazer um filme onde não há o certo e o errado, apenas o complexo em um lugar onde não há nem ar, mas uma bela e sincronizada sinfonia. A combinação perfeita de imagem, som, história, atuação e personagens marcantes. Prepare-se para o turbilhão de informações e curta a vontade, pois nossa equipe, quase em sua totalidade, recomenda este filme! E desculpem qualquer pleonasmo, mas este aqui pode qualquer coisa.


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