12 de abril de 2009

A crise metafísica

(Recebido por e-mail.)

Os tempos atuais oferecem razões para a consciência de crise, que, nos últimos tempos perpassa o mundo. Em primeiro lugar, emerge o paradoxo central da civilização que construímos: o desenvolvimento tecnológico aumentou a distância entre os homens, aprofundou o fosso entre ricos e pobres. Ao mesmo tempo que foram criadas imensas possibilidades para a ação do homem no mundo, a fome, a miséria e a pobreza se alastram reduzindo milhões de pessoas a situações estúpidas, onde é permanente a ameaça de destruição da vida.

O próprio avanço tecnológico tornou possível a atual "revolução tecnológica" (informática, cibernética, robótica), que efetivou a combinação de altíssimo grau de desenvolvimento tecnológico, fazendo da ciência e da tecnologia as primeiras fontes produtoras de riqueza, o que aumentou consideravelmente a produtividade do trabalho humano, com a super-exploração ou mesmo com o desemprego estrutural: o mercado de trabalho é, hoje, mais do que nunca, um mecanismo de seleção, pois o mundo da indústria já tem condições técnicas de dispensar a maior parte dos trabalhadores, exigindo dos que sobram níveis crescentes de qualificação, o que faz de nossas formações sociais não só sociedades produtoras de mercadoria, mas sociedades de informação e de saber.

As conseqüências desse processo são dramáticas: a marginalização de milhões de pessoas do atual estágio de desenvolvimento da humanidade, o que se traduz em falta de moradia, de educação, de lazer, de cultura, de emprego. Nesses tempo difíceis criou-se uma palavra para exprimir o novo desta situação: exclusão, fenômeno que se torna visível na apartação social que caracteriza muitas sociedades.

Não são fenômenos de hoje as inúmeras situações de violência de todos os tipos, o massacre de crianças e adolescentes, o abandono de crianças nas ruas, a situação humilhante nos presídios, a discriminação de raças, as diferentes formas de opressão das mulheres, a intransigência cultural, a negação sistemática da diversidade, a rejeição da alteridade, a perseguição de minorias de raça, de sexo, de etnia, de dissidentes aos regimes e a sistemática destruição da natureza?

Hoje, a humanidade já sabe que a universalização dos padrões de desenvolvimento e de consumo do mundo desenvolvido conduzirá a um apocalipse ecológico: o crescimento demográfico acoplado a uma série de fenômenos, que são conseqüências inevitáveis da sistemática imposição do homem sobre a natureza e de sua destruição, como o aquecimento da atmosfera, a contaminação da água com produtos químicos, a diminuição dos produtos de alimentação, a longo prazo, numa palavra, a vitória cada vez maior do homem sobre o outro de si, a natureza, conduz à auto-destruição, inclusive também porque o homem é um ser de natureza.

Para onde caminha a humanidade? O que aqui está em jogo parece ser o questionamento radical de uma determinada cultura entendida como modo determinado de interpretar o existir do homem na história. Trata-se de uma ameaça global, que nos leva a retomar a pergunta pela validade sentido-fundamento, que a cultura moderna nos legou e que se exprimiu filosoficamente na "metafísica da modernidade", a filosofia da subjetiviade.

Assim, a crise é uma crise do sentido da vida humana, de sua inserção na natureza, no meio ambiente, em última instância, no todo da realidade, uma crise dos critérios fundamentais de seu agir, é uma crise do referencial último de seu existir, é, por isto, uma crise "metafísica", enquanto aquela instância que levanta a pretensão de tematizar os pressupostos intranscendíveis do pensar, do falar, do ser e do agir do homem no mundo, o que implica uma tematização dos princípios últimos da realidade enquanto tal.

Helder Salvador é professor de Filosofia da Faculdade Salesiana de Vitória

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