A entrevista é longa, mas vale a pena para, no mínimo, conhecer o assunto antes de simplesmente o sair criticando sem nenhuma base.
(Original aqui)
Chávez quer ficar mais 14 anos no poder, diz guru político
Afirmação é de William Izarra, assessor do presidente venezuelano.
Segundo ele, só em 2021 a transição para o novo socialismo estará completa.
O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, quer ficar no poder pelo menos até 2021. Só então estará completa a "transição" do atual regime capitalista para o "socialismo do século XXI", modelo político que o venezuelano tenta implantar em seu país.
É o que disse ao G1 William Izarra, um dos mais importantes assessores políticos de Chávez e um dos criadores do conceito desse novo socialismo, que mistura em sua teoria Jesus Cristo, Che Guevara e Simon Bolívar (militar venezuelano que há 200 anos lutou pela independência de vários territórios da América Espanhola).
Izarra detalhou o projeto político de Chávez e disse que o plano prevê o cumprimento desse atual mandato de sete anos na presidência e uma reeleição para mais sete anos no poder. "Hugo Chávez deu 14 anos para que essa modificação esteja completa. E isso deve acontecer, porque na modificação que está prevista na atual Constituição deve ser acrescentada a emenda da reeleição indefinida. Ou seja, ele pode ser reeleito em 2013 para continuar com a reforma", disse Izarra, em entrevista exclusiva ao G1. Leia abaixo a íntegra.
G1 - Qual é a sua função no processo político pelo qual passa a Venezuela?
William Izarra - O presidente [Hugo Chávez] propôs a criação do chamado "Centro de Formação Ideológica" para enfrentar a oposição no referendo revogatório de 2003. Naquela ocasião foi criada uma ideologia, e Chávez me chamou para coordená-la.
G1 - E do que se trata?
Izarra - A idéia é difundir e aprimorar a consciência revolucionária entre os venezuelanos. Essa conscientização é parte do processo de desenvolvimento de uma estrutura que chamamos “poder popular”. A idéia é estimular as pessoas para que elas formem unidades com base no voluntarismo. Estamos na primeira etapa, da difusão ideológica do socialismo do século XXI. E uma maneira didática de divulgar essas idéias é através de seminários e conferências. Por isso eu estou levando essas palestras a todo o país, a todos os municípios e a todas as igrejas.
G1 - Qual é a diferença desse novo socialismo para o adotado no século passado?
Izarra - A novidade é o componente espiritual. Jesus Cristo, Bolívar, Che Guevara e Hugo Chávez são ícones que não existem no modelo cubano, por exemplo, um modelo basicamente marxista. E para um marxista o fato de Cristo estar presente seria uma verdadeira heresia. O socialismo do século XXI está estruturado em Bolívar, introduz Cristo dentro do que pode ser a busca do bem comum, o amor dentre os seres e a confraternização entre todos. Além disso, a definição de propriedade privada do nosso socialismo não descarta a propriedade privada.
G1 - E como o senhor acha que esse modelo vai se desenvolver?
Izarra - Ainda não sabemos porque estamos inventando [esse novo modelo].
G1 - Do ponto de vista econômico, o socialismo do século XXI não seria igual ao modelo marxista, já que este último também prega a igualdade, a solidariedade e o bem comum?
Izarra - É provável. Mas temos hoje uma nova maneira de interpretar a realidade, temos mais energia. É provável que no fundo o que se busque é a mesma coisa, sim, mas acho que nosso modelo faz parte de um determinado momento histórico que estamos vivendo. A esquerda tradicional é superada pelos conceitos do socialismo do século XXI porque tem uma dimensão muito mais humana e mais justa. Aliás, é provável que o socialismo do século XXI inspire uma nova esquerda na Europa em pouco tempo.
G1 - Como esse novo socialismo pretende competir com o capitalismo?
Izarra - O ser humano sempre será igual e o que nos cerca, nos modifica e nos altera também sempre serão os mesmos elementos. A diferença desse socialismo para o de outra época é o momento em que se desenvolve essa revolução. O momento atual estimula as pessoas a adotarem uma postura mais ativa em relação aos meios de produção, ter uma atitude que busca acabar com o domínio hegemônico no mundo, ter uma disposição plena a entender e assumir o ser humano como irmão fraterno e solidário. Lembre-se que cada época está constituída por diferentes gerações e pela constante evolução do ser. Hoje há novas formas de interpretar o mundo e a vida.
G1 - Como seria o sistema de produção nesse novo socialismo?
Izarra - Não será a produção sustentada pelo mercado, que se traduz na acumulação do benefícios. Aqui a produção não busca esse materialismo, busca a satisfação das necessidades básicas para a sustentação das pessoas, mas principalmente para a satisfação coletiva da humanidade. Por isso estamos estimulando o conceito de empresa de produção social. Isso dentro do marca de um modelo capitalismo que ainda vigora na Venezuela. Como resolver essa contradição? Acho que a própria dinâmica irá produzir os canais. Como fazer para romper o esquema dominante que leva a população a ser capitalista? Isso leva tempo, é o grande desafio.
G1 - E como funcionariam essas empresas de produção social?
Izarra - Ela tem de estar sustentada nesse socialismo que estou falando. Deve produzir o bem comum. Vamos pegar como exemplo um pescador. O pescador atual, artesanal, pequeno produtor, sai para pescar, traz o peixe e o entrega a um comerciante. Esse comerciante é o cabeça do que podemos chamar de máfia que vende peixes. A mudança na produção na pesca socialista seria esse pescador deixar de atuar de forma individualista, para que ele possa se unir ao coletivo. Que ele tenha sua própria estrutura, lancha, geladeira. E aí o Estado entra com a ajuda em estrutura, em permitir que ele mesmo leve o produto e comercialize o peixe. Isso quebraria a espiral monopolizadora capitalista que é o que faz os preços muito maiores e exploram o trabalhador. Uma vez resolvido esse conflito básico, a produção não estaria mais a serviço do capitalismo, da economia de mercado, que explora o trabalhador e fica com os benefícios.
G1 - Em que nível de desenvolvimento deve estar a sociedade para que isso ocorra?
Izarra - O socialismo do século XXI tem 3 grandes componentes. O primeiro é o bem comum. Tudo o que se faça está sustentado na comunidade, não no indivíduo. A busca da produção para o bem comum. Para chegar a esse nível temos de ser solidários e sentir amor em relação ao coletivo. O segundo componente é a produção social. O terceiro é a democracia com participação direta. O sistema só funcionará dessa maneira que eu expliquei quando esses 3 elementos estiverem funcionando ao mesmo tempo.
G1 - Depois do juramento de posse no dia de sua reeleição, no dia 10 de janeiro deste ano, Hugo Chávez disse que o período de transição já acabou. O que ele quis dizer?
Izarra - Que a partir de agora começa a etapa de transição, porque o povo ainda não tem o poder, e o objetivo final é que o povo tenha o poder. O sistema socialista é um novo modelo político que substituirá o modelo atual, mas isso ainda não aconteceu. Muitas estruturas do estado burocrático seguem vivas. É parte da luta resolver essas contradições.
G1 - E como seria essa transição de poder?
Izarra - Começa com os motores que o presidente anunciou na posse: a Lei Habilitante [que deu a Chávez poderes de legislar por um ano e meio no lugar dos parlamentares], que está em vigor; a educação socialista, que vem sendo colocada em prática por meio dos centros de formação ideológica; a reestruturação territorial do Estado; e, finalmente, uma nova Constituição do Estado socialista. Essas são as mudanças necessárias na estrutura do Estado que permitirão que entreguemos o poder ao povo.
G1 - Quando isso poderá acontecer?
Izarra - O período da Lei habilitante é um ano e meio, e a comissão encarregada de preparar a reforma da nova Constituição já está quase entregando os trabalhos. Pelo menos até 2007 estaremos ainda em fase de preparação teórica-conceitual. Chávez decidiu que o período de transição do poder deve abarcar o período de 2007 ao 2021. Mas é muito difícil prever o desenvolvimento dos fenômenos sociais. Mas eu repito: Hugo Chávez deu 14 anos para que essa modificação esteja completa. E isso deve acontecer, porque na modificação que está prevista na Constituição deve ser acrescentada a emenda da reeleição indefinida. Ou seja, ele pode ser reeleito em 2013 para continuar com a reforma.
G1 - O que o senhor diria aos críticos que dizem que a Venezuela está andando para trás, que está olhando para o passado com essas idéias?
Izarra - Eu diria que basta observar atentamente para ver os avanços conquistados. Nunca os setores excluídos do sistema tiveram tanta participação e oportunidade.
(Original aqui)
Chávez quer ficar mais 14 anos no poder, diz guru político
Afirmação é de William Izarra, assessor do presidente venezuelano.
Segundo ele, só em 2021 a transição para o novo socialismo estará completa.
O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, quer ficar no poder pelo menos até 2021. Só então estará completa a "transição" do atual regime capitalista para o "socialismo do século XXI", modelo político que o venezuelano tenta implantar em seu país.
É o que disse ao G1 William Izarra, um dos mais importantes assessores políticos de Chávez e um dos criadores do conceito desse novo socialismo, que mistura em sua teoria Jesus Cristo, Che Guevara e Simon Bolívar (militar venezuelano que há 200 anos lutou pela independência de vários territórios da América Espanhola).
Izarra detalhou o projeto político de Chávez e disse que o plano prevê o cumprimento desse atual mandato de sete anos na presidência e uma reeleição para mais sete anos no poder. "Hugo Chávez deu 14 anos para que essa modificação esteja completa. E isso deve acontecer, porque na modificação que está prevista na atual Constituição deve ser acrescentada a emenda da reeleição indefinida. Ou seja, ele pode ser reeleito em 2013 para continuar com a reforma", disse Izarra, em entrevista exclusiva ao G1. Leia abaixo a íntegra.
G1 - Qual é a sua função no processo político pelo qual passa a Venezuela?
William Izarra - O presidente [Hugo Chávez] propôs a criação do chamado "Centro de Formação Ideológica" para enfrentar a oposição no referendo revogatório de 2003. Naquela ocasião foi criada uma ideologia, e Chávez me chamou para coordená-la.
G1 - E do que se trata?
Izarra - A idéia é difundir e aprimorar a consciência revolucionária entre os venezuelanos. Essa conscientização é parte do processo de desenvolvimento de uma estrutura que chamamos “poder popular”. A idéia é estimular as pessoas para que elas formem unidades com base no voluntarismo. Estamos na primeira etapa, da difusão ideológica do socialismo do século XXI. E uma maneira didática de divulgar essas idéias é através de seminários e conferências. Por isso eu estou levando essas palestras a todo o país, a todos os municípios e a todas as igrejas.
G1 - Qual é a diferença desse novo socialismo para o adotado no século passado?
Izarra - A novidade é o componente espiritual. Jesus Cristo, Bolívar, Che Guevara e Hugo Chávez são ícones que não existem no modelo cubano, por exemplo, um modelo basicamente marxista. E para um marxista o fato de Cristo estar presente seria uma verdadeira heresia. O socialismo do século XXI está estruturado em Bolívar, introduz Cristo dentro do que pode ser a busca do bem comum, o amor dentre os seres e a confraternização entre todos. Além disso, a definição de propriedade privada do nosso socialismo não descarta a propriedade privada.
G1 - E como o senhor acha que esse modelo vai se desenvolver?
Izarra - Ainda não sabemos porque estamos inventando [esse novo modelo].
G1 - Do ponto de vista econômico, o socialismo do século XXI não seria igual ao modelo marxista, já que este último também prega a igualdade, a solidariedade e o bem comum?
Izarra - É provável. Mas temos hoje uma nova maneira de interpretar a realidade, temos mais energia. É provável que no fundo o que se busque é a mesma coisa, sim, mas acho que nosso modelo faz parte de um determinado momento histórico que estamos vivendo. A esquerda tradicional é superada pelos conceitos do socialismo do século XXI porque tem uma dimensão muito mais humana e mais justa. Aliás, é provável que o socialismo do século XXI inspire uma nova esquerda na Europa em pouco tempo.
G1 - Como esse novo socialismo pretende competir com o capitalismo?
Izarra - O ser humano sempre será igual e o que nos cerca, nos modifica e nos altera também sempre serão os mesmos elementos. A diferença desse socialismo para o de outra época é o momento em que se desenvolve essa revolução. O momento atual estimula as pessoas a adotarem uma postura mais ativa em relação aos meios de produção, ter uma atitude que busca acabar com o domínio hegemônico no mundo, ter uma disposição plena a entender e assumir o ser humano como irmão fraterno e solidário. Lembre-se que cada época está constituída por diferentes gerações e pela constante evolução do ser. Hoje há novas formas de interpretar o mundo e a vida.
G1 - Como seria o sistema de produção nesse novo socialismo?
Izarra - Não será a produção sustentada pelo mercado, que se traduz na acumulação do benefícios. Aqui a produção não busca esse materialismo, busca a satisfação das necessidades básicas para a sustentação das pessoas, mas principalmente para a satisfação coletiva da humanidade. Por isso estamos estimulando o conceito de empresa de produção social. Isso dentro do marca de um modelo capitalismo que ainda vigora na Venezuela. Como resolver essa contradição? Acho que a própria dinâmica irá produzir os canais. Como fazer para romper o esquema dominante que leva a população a ser capitalista? Isso leva tempo, é o grande desafio.
G1 - E como funcionariam essas empresas de produção social?
Izarra - Ela tem de estar sustentada nesse socialismo que estou falando. Deve produzir o bem comum. Vamos pegar como exemplo um pescador. O pescador atual, artesanal, pequeno produtor, sai para pescar, traz o peixe e o entrega a um comerciante. Esse comerciante é o cabeça do que podemos chamar de máfia que vende peixes. A mudança na produção na pesca socialista seria esse pescador deixar de atuar de forma individualista, para que ele possa se unir ao coletivo. Que ele tenha sua própria estrutura, lancha, geladeira. E aí o Estado entra com a ajuda em estrutura, em permitir que ele mesmo leve o produto e comercialize o peixe. Isso quebraria a espiral monopolizadora capitalista que é o que faz os preços muito maiores e exploram o trabalhador. Uma vez resolvido esse conflito básico, a produção não estaria mais a serviço do capitalismo, da economia de mercado, que explora o trabalhador e fica com os benefícios.
G1 - Em que nível de desenvolvimento deve estar a sociedade para que isso ocorra?
Izarra - O socialismo do século XXI tem 3 grandes componentes. O primeiro é o bem comum. Tudo o que se faça está sustentado na comunidade, não no indivíduo. A busca da produção para o bem comum. Para chegar a esse nível temos de ser solidários e sentir amor em relação ao coletivo. O segundo componente é a produção social. O terceiro é a democracia com participação direta. O sistema só funcionará dessa maneira que eu expliquei quando esses 3 elementos estiverem funcionando ao mesmo tempo.
G1 - Depois do juramento de posse no dia de sua reeleição, no dia 10 de janeiro deste ano, Hugo Chávez disse que o período de transição já acabou. O que ele quis dizer?
Izarra - Que a partir de agora começa a etapa de transição, porque o povo ainda não tem o poder, e o objetivo final é que o povo tenha o poder. O sistema socialista é um novo modelo político que substituirá o modelo atual, mas isso ainda não aconteceu. Muitas estruturas do estado burocrático seguem vivas. É parte da luta resolver essas contradições.
G1 - E como seria essa transição de poder?
Izarra - Começa com os motores que o presidente anunciou na posse: a Lei Habilitante [que deu a Chávez poderes de legislar por um ano e meio no lugar dos parlamentares], que está em vigor; a educação socialista, que vem sendo colocada em prática por meio dos centros de formação ideológica; a reestruturação territorial do Estado; e, finalmente, uma nova Constituição do Estado socialista. Essas são as mudanças necessárias na estrutura do Estado que permitirão que entreguemos o poder ao povo.
G1 - Quando isso poderá acontecer?
Izarra - O período da Lei habilitante é um ano e meio, e a comissão encarregada de preparar a reforma da nova Constituição já está quase entregando os trabalhos. Pelo menos até 2007 estaremos ainda em fase de preparação teórica-conceitual. Chávez decidiu que o período de transição do poder deve abarcar o período de 2007 ao 2021. Mas é muito difícil prever o desenvolvimento dos fenômenos sociais. Mas eu repito: Hugo Chávez deu 14 anos para que essa modificação esteja completa. E isso deve acontecer, porque na modificação que está prevista na Constituição deve ser acrescentada a emenda da reeleição indefinida. Ou seja, ele pode ser reeleito em 2013 para continuar com a reforma.
G1 - O que o senhor diria aos críticos que dizem que a Venezuela está andando para trás, que está olhando para o passado com essas idéias?
Izarra - Eu diria que basta observar atentamente para ver os avanços conquistados. Nunca os setores excluídos do sistema tiveram tanta participação e oportunidade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário