28 de agosto de 2007

Governo Bush gerou inversão política nos EUA

(Original aqui)

Faz parte da política americana (mas não só) um presidente ter pouca força política quando se aproxima do final de seu mandato, e não disputa a reeleição. Mesmo assim o final de mandato de George W. Bush é único. O ocaso do presidente começou mais cedo do que se considera “normal” mesmo para alguém com popularidade tão baixa – não espanta a última deserção, a do Secretário de Justiça, mais um “Bushie” cercado por escândalos.

O ocaso de Bush é único pois se fala também no fim de uma corrente política – a do partido Republicano -- que dominou os EUA por quase 50 anos. Não se trata de um partido que anda mal nas urnas e precisa de um tempo na oposição para reagrupar-se (o exemplo mais recente é o do PSOE na Espanha, que foi derrotado pelos conservadores, reagrupou-se e voltou ao poder). Trata-se, ao que tudo indica, de uma monumental inversão de maré política.

Pela primeira vez em muitos anos mais de 50% do eleitorado americano identifica-se com um candidato democrata, contra apenas 35% com um candidato republicano. Para se ter uma idéia do que isso significa, apenas uma vez, em 1964, um candidato democrata venceu as eleições com mais de 50% dos votos (o outro foi Jimmy Carter, em 1976, logo após Watergate, e que foi quatro anos depois varrido da Casa Branca). Os republicanos venceram seis das eleições nos últimos 40 anos com mais da metade dos votos.

Os números das pesquisas (e o placar da arrecadação de doações) falam uma linguagem muito clara, e totalmente a favor dos democratas. Mais importante, porém, é o debate político e ideológico – é onde se nota o extraordinário recuo republicano. Temas como aborto, favorito dos grupos evangélicos, estão cedendo lugar para problemas com o meio ambiente. Em questões como o uso de células de embriões para pesquisas, a maioria dos americanos mostra-se a favor.

Temas favoritos dos republicanos, como menos impostos, menos Estado e força militar perderam-se no governo Bush, e deles se apropriaram candidatos democratas (que, aliás, copiaram até mesmo técnicas eleitorais desenvolvidas pelo marqueteiro de Bush, como o famoso “get out to vote” –saia para votar-, importante num país no qual não é obrigatório votar).

Em termos eleitorais os republicanos conseguiram dividir o país de maneira muito clara nos últimos 40 anos, conquistando o Sul e o Oeste e empurrando os democratas para uma desconfortável posição de partido “regional” da Costa Leste. No ano passado os democratas tomaram de assalto velhos bastiões republicanos em lugares como Arizona, Novo México e Colorado.

Onde antes a população crescia mais rápido, e chegava o maior número de imigrantes, podia-se dizer que os republicanos venceriam eleições. Não é mais assim: até mesmo as coligações de movimentos cristãos parecem sem liderança e não conseguem se unir em torno de um candidato republicano. Um dos nomes novos e atraentes do partido, o do governador Mitt Romney, admite que os republicanos “têm de tentar conquistar o eleitorado a partido do centro novamente”.

Há uma boa discussão nos Estados Unidos no momento tentando estabelecer quanto da derrocada republicana foi obra de Bush, e quanto a maré já teria virado em 2000 se Al Gore tivesse sido um melhor candidato (implícita está a pergunta se ao mundo teria sido economizado um George W. Bush). Para quem acha que o pêndulo leva os Estados Unidos para a “esquerda”, para os democratas, é bom lembrar que tipo de “esquerda” é essa.

Al Gore teria perdido as eleições de 2000, diz Bill Clinton em suas memórias, por ter se oposto ao direito dos americanos de portar armas de fogo. Não é mais o caso. Hillary Clinton e Barack Obama já disseram que todo americano deve poder manter uma arma em casa, para casos de emergência.


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