15 de fevereiro de 2008

Devaneios matutinos

Apesar da semana ainda não ter acabado -- já que muita coisa pode acontecer hoje e amanhã --, venho aqui lançar breves idéias que permearam meu pensamento durante esta semana.

Quatro eventos aconteceram nesta semana que me chamaram a atenção. Por motivos que não vêm ao caso, não divulguei tais fatos por aqui de maneira ostensiva, como geralmente costumo fazer. Entretanto, após o quarto evento acontecer ontem, não resisti e tive de vir aqui escrever um pouquinho sobre o assunto.

Como já disse Marx, na introdução de seu livro Crítica da filosofia do direito de Hegel (São Paulo: Boitempo Editorial, 2005), "a religião é o ópio do povo". Se colocarmos esta frase no Google aparecerão milhões de sites que falam sobre o assunto; pretendo aqui apenas colocar "meus dois centavos" e fazer alguns breves comentários.

Por que fiz mais uma citação desta frase de Marx? Porque os quatro eventos tiveram relação com preceitos religiosos -- e mais uma vez me surpreendi com isto. Talvez eu não devesse mais me surpreender com atitudes e ações fundamentadas em argumentos "religiosos", mas não consigo: cada vez que vejo pessoas inteligentes deixando de lado sua razão e seu bom-senso para atuar em nome do que outros dizem que é certo e não de acordo com suas próprias convicções, me assusto, me surpreendo e me dou conta da atualidade que a frase de Marx tem: por mais que ela tenha sido escrita em 1843, cai como uma luva para muitos dos acontecimentos contemporâneos.

E eu me pergunto: o que leva uma pessoa inteligente a abrir mão de algo que quer porque "minha religião não permite"? Mais ainda: o que leva uma pessoa inteligente a se submeter de maneira a-crítica a preceitos às vontades daqueles que criam as "leis divinas"? O que leva alguém a se "entorpecer" com sua religião?

Vejam, meus caros leitores, que não questiono de forma alguma a espiritualidade de ninguém: isto é parte fundamental de todos os Seres que se encontram vivendo neste planeta. Negar o lado espiritual do ser humano é algo inconcebível para mim. Como alguém (não sei quem) disse, "Não somos seres humanos passando por uma experiência espiritual. Somos seres espirituais passando por uma experiência humana" -- isso pra mim é algo claro e transparente como as águas do Lago Baikal (hehehe).

O que questiono, não há dúvida, é a religião, seja lá qual for. Questiono-a porque ela é uma instituição humana, uma instituição mundana e, como tal, como algo criado pelo ser humano, é imperfeita -- ou, no mínimo, sujeita a erros e falhas. Como é sabido por todos, a religião é algo corrupto, é algo que aliena o indivíduo e faz com que o mesmo pare de pensar, pare de raciocinar, pare de buscar o melhor de si próprio para fazer apenas aquilo que ela -- religião -- quer que o indivíduo faça. A religião faz com que o indivíduo aja da mesma maneira que bovinos indo para o matadouro. Simplesmente não há escapatória: deve-se fazer o que o líder da religião "manda" porque, caso contrário, "vamos para o inferno". O senso crítico do indivíduo é totalmente jogado para debaixo do tapete e esquecido -- pois se o indivíduo pensar, se o indivíduo raciocinar, estará cometendo um "pecado" e sofrerá as conseqüências de sua ação. A religião faz, portanto, com que a espiritualidade seja considerada como algo externo, algo que vem da instituição, quando na verdade a espiritualidade está dentro de cada um...

Volto à frase de Marx. A religião reflete o que falta na sociedade, ou seja, é uma idealização das aspirações do povo, aspirações estas que não podem ser satisfeitas de imediato e que, portanto, precisam ser idealizadas de alguma maneira (o problema é que, como sabemos, toda idealização traz frustrações). No contexto de Marx, a religião tem uma função social: distrair os oprimidos da realidade de sua opressão. Enquanto os explorados acreditarem que seu sofrimento e sua dor lhes trarão liberdade e felicidade no futuro, estarão considerando a opressão como parte de uma ordem natural -- um fardo necessário e não uma coisa imposta pelos outros homens. É isso o que Marx queria dizer ao chamar a religião de "ópio do povo": por um lado ela alivia a dor do indivíduo, mas, ao mesmo tempo, torna-o preguiçoso, nublando sua percepção da realidade e tirando-lhe a vontade de mudar e de correr atrás de seus interesses de acordo com sua própria vontade.

As situações vividas por mim nesta semana serviram para mostrar o quão Marx continua sendo atual. Muitas de suas observações, feitas no séc. XIX, ainda são aplicáveis na nossa atualidade -- ao contrário do que muitos pensam. Ao mesmo tempo, é uma pena ver que ainda há muitas pessoas que se situam no séc. XIX, no que diz respeito à sua maneira de pensar...


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