27 de agosto de 2008

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(Original aqui.)

Lei pode reduzir corrupção de lobbies

Pesquisa revela apoio de 90% dos líderes no Congresso para regulamentar a atividade. Um dos objetivos é garantir transparência

A prática do lobby, quase tão antiga quanto a política, poderia hoje ser mais transparente e menos corruptora no Brasil caso estivesse regulamentada em lei, afirma o advogado Luiz Alberto dos Santos. Ele defendeu tese de doutorado sobre o tema na Universidade de Brasília (UnB). "A regulamentação da atividade é um instrumento crucial para garantir a legitimidade da função do lobista, além de assegurar a credibilidade das instituições públicas onde ela ocorre", diz.

Em seu estudo, Santos traçou uma minuciosa comparação sobre a prática do lobby nos Estados Unidos e no Brasil. De um lado, na América do Norte, vigora a lei mais antiga regulamentando a profissão. Criada em 1946, um ano depois da vitória dos aliados na Segunda Guerra Mundial, a lei foi consolidada em seis décadas de uso contínuo. Do outro lado, um Brasil recém democratizado, porém maduro no tema, vive um momento sem precedentes em favor da regulamentação do lobby nos três Poderes, avalia Santos.

Como parte da tese, em 2007 o advogado promoveu uma pesquisa com os 60 parlamentares mais influentes do Congresso Nacional, selecionados na lista do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap). A relação inclui líderes partidários, presidentes de comissões e de frentes parlamentares. Na pesquisa, 48 deputados e 12 senadores responderam a um questionário sobre o tema. O resultado não deixa dúvidas: 90% dos principais líderes do legislativo brasileiro são favoráveis à regulamentação do lobby. "Também existe uma aceitação inédita dos próprios lobistas, que desejam sua atividade amparada pela lei", afirma Santos.

Além de resultar em mais transparência e menos corrupção, uma legislação sobre o tema tem outra vantagem: proporcionar acesso de grupos menos influentes e detentores de menor poder econômico às instituições públicas. Conseqüentemente, mais segmentos da sociedade poderão defender seus interesses contra investidas de grandes conglomerados econômicos.

"O direito ao contraditório deverá constar na regulamentação da prática do lobby. Quando o lobista patrocinado por um setor industrial tiver acesso a determinado deputado, por exemplo, esse mesmo parlamentar terá de receber um representante de grupos sociais contrários à posição do lobby, equilibrando, assim, o exercício de influência", explica.

Desde 1984 o tema é recorrente no Congresso Nacional, quando o então senador Marco Maciel apresentou o primeiro Projeto de Lei sobre a atividade de lobista. Vinte e quatro anos se passaram e o mais recente projeto é de autoria do deputado Carlos Zarattini (PT-SP), com grandes chances de seguir adiante na pauta do legislativo. Segundo o pesquisador, a proposta necessita de alguns ajustes, no entanto é a mais completa já elaborada nessas duas décadas de discussões.

Ainda de acordo com Santos, tão importante quanto criar regras para a prática do lobby é garantir instrumentos de fiscalização e monitoramento. Para tornar efetivo esse controle, deverão ser apresentados relatórios regularmente, bem como registros de empresas e grupos envolvidos, tudo disponível na internet, sob responsabilidade de um órgão público, como a Controladoria Geral da União (CGU). Assim, serão divulgados à sociedade todos os trâmites do lobby, desde revelar os nomes dos interessados em determinado assunto até os valores investidos para defender suas posições, inclusive os gastos com salários dos lobistas. Nos EUA, um coordenador de lobby pode receber salário anual de US$ 2 milhões.

Do hotel ao poder

Embora haja registros de uma forma primitiva de lobby já no Império Romano, a atividade começou a ganhar força no século XVIII. A origem da palavra, no entanto, remonta a meados do século seguinte, quando emissários de poderosos empresários assediavam o então presidente dos Estados Unidos, Ulysses Grant, no lobby do hotel onde ele se hospedava na capital Washington. Hoje, o termo é aplicado para definir a tentativa de influenciar legisladores e demais autoridades dos três Poderes por grupos econômicos ou sociais organizados.

Segundo o advogado Luiz Alberto dos Santos, que defendeu tese de doutorado sobre o tema na UnB, os Estados Unidos possuem a lei mais antiga regulamentando a atividade, em vigor desde 1946. Mesmo com tanta experiência no assunto, a lei norte-americana ainda passa por mudanças. A última ocorreu em 2007, quando a quarentena para deputados se tornarem lobistas passou de um para dois anos, além de limitar o recebimento de presentes e o acesso aos gabinetes dos parlamentares.

A regulamentação da atividade por si só não garante menos corrupção, mas é o pontapé inicial, avalia Santos. "A partir daí começará uma mudança cultural na prática, e os mecanismos de controle serão fundamentais no processo", diz. Atualmente o trabalho do lobista é associado a interesses de grupos poderosos, bem como à falta de ética dos profissionais envolvidos, geralmente advogados, e a resultados desastrosos para a sociedade.

Com freqüência o lobista é visto como um corruptor ou traficante de influência, resultado de sua imagem na mídia. Os casos de maior destaque na imprensa envolvem lobbies poderosos e discutíveis, como os do fumo, bebidas alcoólicas, medicamentos e petróleo. A cena final do filme Obrigado por Fumar (EUA - 2005), é um bom exemplo da imagem transmitida pela mídia. Na cena, um redimido lobista da indústria do tabaco se reúne com empresários e ensina: "Olhem no espelho e repitam: não há evidência científica relacionando o uso do celular ao câncer no cérebro".

Rigor nos EUA

A prisão do lobista Jack Abramoff em 2007, condenado por conspiração, fraude, evasão fiscal e roubo de US$ 25 milhões, poderia ser atribuída aos mecanismos de controle que os Estados Unidos mantêm. Quem exerce a atividade por lá deve se credenciar junto à mesa do parlamento norte-americano e declarar quanto e como gasta na ação por ano, caso os investimentos ultrapassem US$ 20 mil (incluindo o salário do profissional).

Além disso, quem sai do governo enfrenta quarentena de dois anos para assumir algum cargo em empresa privada. O rigor chega ao ponto de proibir as esposas desses agentes públicos de se tornarem lobistas. Ex-deputados e senadores perdem direito ao livre trânsito em gabinetes no Congresso para evitar facilidade de acesso aos parlamentares.

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