26 de julho de 2007

Congonhas mostra o colapso do estado

(Original aqui)

O trágico acidente no aeroporto de Congonhas provocou dois sentimentos. O primeiro momento foi de imensa tristeza e impotência diante do fato. Trata-se de uma derrota do Homem para a lógica imponderável do destino. Mas a busca de explicações veio logo a seguir, sobretudo porque o evento foi antecedido por uma prolongada – e ainda não resolvida – crise da aviação brasileira. Mesmo que outros fatores tenham causado a queda, permanecerá a percepção de que a incompetência governamental é uma das explicações para a tragédia.

Só que essa fragilidade estatal vai além dos problemas do transporte aéreo. O Brasil passa por um colapso de sua infra-estrutura, resultado, em boa medida, do descompasso entre as crescentes demandas de modernização da economia e a incapacidade do Estado em responder a isso.

O apagão da infra-estrutura brasileira é uma realidade anterior à crise aérea. As estradas federais estão sucateadas há mais de uma década. Apesar das modernizações recentes, portos e ferrovias nacionais ainda estão anos-luz atrás dos principais competidores internacionais. A exceção se encontra nas telecomunicações. Sem ignorar o recorde de reclamações dos consumidores contra as operadoras, o avanço foi enorme nessa área, colocando o Brasil em pé de igualdade com o que há de melhor no mundo.

O que mais acentua a dimensão desse colapso é a modernização econômica pela qual o Brasil passa nos últimos anos. Se o país não tivesse gerado novas forças econômicas e sociais, o sucateamento da infra-estrutura teria menor efeito. Basta citar o transporte aéreo: o crescimento de 12% ao ano, maior que o da economia, tornou nítida a crise do setor.

Parte da modernização econômica recente advém de reformas da década de 1990. Outra parcela deriva de fatos recentes e externos, como a bonança internacional. Mas foi a estabilidade econômica, iniciada por FHC e aprofundada por Lula, e avanços do governo petista – como a expansão do crédito e da renda dos mais pobres – que hoje tornam mais patente a precariedade da infra-estrutura.

A modernização econômica, ademais, impulsiona novos atores e demandas sociais. Muitos que não viajavam de avião agora viajam. O uso cada vez maior da internet eleva a expectativa dos cidadãos e empresas com a infra-estrutura – e aí se descobre que o Brasil vive em dois mundos: um em intensa transformação e outro, lento, onde os meios não se adequam ao crescente espírito empreendedor.

Em qualquer nação bem-sucedida, o Estado é o fiador do sistema de infra-estrutura. Isso não quer dizer que ele deva assumir diretamente toda a provisão de serviços. Ao contrário, cada vez mais há uma dinâmica de múltiplos provedores e tipos diferentes de contratação. Falta ao Brasil, hoje, definir com clareza seu desenho institucional de regulação, implementando-o sem ideologismos, de forma eficiente e célere.

O que está acontecendo com os aeroportos no governo Lula repete-se na dificuldade em realizar concessões de estradas – e há mais mortes no transporte terrestre que no aéreo. Não basta aumentar a taxa de investimento público se a administração pública não se profissionaliza para tal tarefa. Aumentar as verbas e as obras da Infraero que existem hoje é jogar dinheiro no lixo. O ataque ao colapso da infra-estrutura depende de um projeto de modernização do Estado, para que ele acompanhe o ritmo frenético de mudança da economia e da sociedade brasileiras. Sem isso, ficaremos à mercê do destino – e voltaremos ao primeiro e impotente sentimento diante da tragédia de Congonhas.


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