10 de abril de 2007

A ausência do Estado gera mais violência que a guerra

(Original aqui)

O eclipse do Estado é pior que a guerra. Sua inexistência deixa orfã a sociedade que não consegue subsistir sem regras e poderes adequados pra fazer valer a lei.

O esfacelamento de valores e das estruturas públicas permite a propagação de grupos e milícias que impõem à população a sua vontade unilateral.

A falência do Estado nessas circunstâncias gera desdobramentos muito mais sérios do que a incapacidade de assegurar o fornecimento de energia elétrica ou ampliar a expansão do emprego.

Ali onde inexiste a presença do Estado, a população vive jogada nas garras de um pesadelo hobesiano.

Essa é a advertência feito pelo professor de política internacional da Universidade de Londres, Toby Dodge, em artigo publicado domingo na Folha - "Morte do Estado impulsiona violência sem fim no Iraque" (só para assinantes), onde analisa o caos vivido hoje no Iraque depois da invasão norte-americana.

O problema maior, diz Dodge, não é nem a guerra, mas a ausência de regras.

Os EUA não apenas derrubaram Saddan mas esfacelaram o Estado iraquiano, inclusive suas estruturas físicas, arquivos, memória, comunicações, entregando a população a uma espécie de ano zero da civilização. O pesadelo de conflitos entre facções e bandos criminosos que germina nesse vale-tudo, gera uma espiral insandecida de violência e insegurança. É nesse ambiente infeccionado de autoritarismo e medo que germinam as milícias e bancos armados fazendo justiça com as próprias mãos.

A advertência do professor Toby Dodge remete a um caso extremo, mas é impossível ler trechos do seu artigo sem pensar nas periferias conflagradas das nossas metrópoles.
Vale refletir, por exemplo:


1. O reconhecimento de que a situação é precária, e está piorando, oculta desacordos e confusão quanto às causas subjacentes da (violência) que agora domina (...)

2. A capacidade administrativa do Estado já havia sido solapada por mais de uma década (entrou em colapso)

3. Os saqueadores começaram levando itens portáteis e valiosos, como computadores, e depois carregaram a mobília, e até pedaços dos prédios (...) os saqueadores estavam sistematicamente removendo os cabos elétricos ... para vendê-los como refugo.

4. . Diante desse pano de fundo ( situação de falência do Estado) a instabilidade é propelida por dois problemas interligados, que causaram a profunda insegurança e violência que agora dominam o país (...) um agudo vácuo de segurança, que foi aproveitado por grupos dispostos a usar a violência em benefício próprio. O crime organizado se tornou uma fonte dominante de insegurança.

5. O colapso do Estado, e o vácuo de segurança resultante (...) propeliram diferentes conjuntos de forças que usam a violência para seus próprios fins. O primeiro deles envolve quadrilhas criminosas de poderio industrial, as quais aterrorizam (...) a classe média...

6. Muito mais séria do que a incapacidade do governo para elevar a produção de eletricidade ou estimular o emprego, a capacidade que as quadrilhas criminosas continuam a exibir indica a falência do Estado.

7. O domínio das milícias não foi um resultado inevitável (...) mas uma resposta ao colapso do Estado: ...é preciso um governo capaz de exercer monopólio sobre os poderes de coerção, e dotado de capacidade administrativa que lhe confira legitimidade.

8. Diante do colapso da estrutura de Estado, a capacidade da sociedade de influenciar os acontecimentos de maneira positiva desaparece ...

9. O governo teria de reconstituir sua capacidade de administração e de segurança, e estabelecer o domínio da lei.

10. A incapacidade ( ...) para reconstruir essas instituições é o ponto focal do problema. Até que a capacidade do Estado seja reconstruída de maneira significativa, (...)continuará a (...) instabilidade violenta, e a população continuará nas garras de um pesadelo hobbesiano. Suas vidas serão desagradáveis..."


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