24 de julho de 2007

Costumes antigos

Estou lendo um livro que narra a maneira como os indivíduos se comportavam durante a Idade Média e como tais costumes foram sendo transformados até chegarem à maneira como nos comportamos nos dias de hoje.

Uma das partes do livro está reproduzida abaixo. Achei interessante porque os textos abaixo foram retirados do que seriam os "manuais de etiqueta" de suas respectivas épocas (apontadas também abaixo). Se os manuais diziam para os indivíduos se comportarem de tal maneira, imaginemos como as pessoas efetivamente se comportavam no seu dia-a-dia...

Extraído de De civilitate morum puerilium, de Erasmo. Os excertos foram retirados da edição de Colônia, de 1530, que provavelmente já fora lançada com finalidades educativas.

É indelicado cumprimentar alguém que esteja urinando ou defecando...

A pessoa bem educada sempre deve evitar expor, sem necessidade, as partes às quais a natureza atribuiu pudor. Se a necessidade a compele, isto deve ser feito com decência e reserva, mesmo que ninguém mais esteja presente. Isto porque os anjos estão sempre presentes e nada mais lhes agrada em um menino do que pudor, o companheiro e guardião da decência. Se produz vergonha mostrá-las aos olhos dos demais, ainda menos devem ser elas expostas pelo toque.

Prender a urina é prejudicial à saúde e urinar em segredo diz bem do pudor. Há aqueles que ensinam que o menino deve prender os gases, comprimindo-os no intestino. Mas não é conveniente, esforçando-se para parecer educado, contrair uma doença. Se for possível retirar-se do ambiente, que isto seja feito a sós. Mas, em caso contrário, de acordo com o antigo provérbio, que a tosse esconda o som. Além do mais, por que esses mesmos trabalhos não ensinam que meninos não devem defecar, uma vez que é mais perigoso prender os gases do que conter os intestinos?

(...)

(...) Escute a velha máxima sobre o som do vento. Se ele puder ser solto sem ruído, isto será melhor. Mas ainda melhor, ser solto com ruído do que contido.

A esta altura, porém, teria sido útil suprimir a sensação de embaraço de modo ou a acalmar o corpo ou, seguindo o conselho de todos os médicos, apertar bem juntas as nádegas e agir de acordo com as sugestões do epigrama de Aethon: fazia de tudo para não peidar explosivamente em lugar sagrado, e orou a Zeus, embora com as nádegas comprimidas. O som do peido, especialmente das pessoas que se encontram em lugar elevado, é horrível. Sacrifícios devem ser feitos, com as nádegas fortemente comprimidas.

Tossir para ocultar o som explosivo: aqueles que, porque estão embaraçados, não querem que o vento explosivo seja escutado, simulam um ataque de tosse. Siga a regra de uma quilíade: substitua os peidos por acessos de tosse.

(...)

De Galateo (1558), de Della Casa, extraído da edição em cinco idiomas (Genebra, 1609, p. 32):

Além do mais, não fica bem a um homem decoroso e honrado preparar-se para se aliviar na presença de outras pessoas, nem erguer as roupas, depois, na presença delas. Analogamente, não lavará as mãos ao voltar para a sociedade decente vindo de lugares privativos, uma vez que a razão para lavá-las provocará pensamentos desagradáveis nas pessoas. Pela mesma razão, não é hábito refinado, quando se encontra alguma coisa regupnante na rua, como às vezes acontece, virar-se imediatamente para o companheiro e lhe chamar a atenção para isso.

É ainda mais incorreto segurar a coisa malcheirosa para que o outro a cheire, como alguns têm o costume de fazer, e que mesmo insistam em que o outro faça isso, erguendo a coisa fedorenta até suas narinas e dizendo: “Eu gostaria de saber o que é que você acha disto”, quando seria melhor dizer: “Porque fede, não a cheire.”

Fonte: ELIAS, Norbert. O processo civilizador. Rio de Janeiro: Jore Zahar Ed., 1994. 2v. Pág, 135-137 (V.1).


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